Que futuro terei eu ao lado de um homem que tem um filho de outra mulher, sabendo eu que um dia quererei ter os meus filhos e que para ele não serão os seus primeiros filhos? Morando a mais de trezentos quilómetros um do outro e supondo que não vai largar a quinta e os animais, a casa que está a construir e a pista de MotoCross para vir viver para arredores de Lisboa, como nos vamos conhecer melhor, como vamos colmatar os anos todos que tivemos separados, unindo assim o passado ao futuro e voltar a sentir o que sentimos antes (ou quem sabe já não há nada para sentir)? Sendo racional mais uma vez: estou efectiva numa escola na zona de Lisboa, comprei casa nos arredores, estava a construir uma relação geograficamente perto da minha casa, aliás, comprei a casa perto do meu então namorado precisamente para poder fazer crescer a relação, desisti dos planos de viver na minha terra natal ao desistir do destacamento para aproximação à residência, investi numa relação que durou quase um ano e meti a minha vida a mexer e agora vou largar tudo para ir ter com um homem que se diz infeliz mas ainda assim mantém uma relação só para não ficar sozinho, ou porque é cómodo ter alguém seguro do seu lado? Sinceramente acho que não e acho que não estou a ser cobarde ou demasiado racional, é um misto dos dois mecanismos. Posso estar a ser cobarde por ter medo de a relação falhar, por ter como exemplo o facto de o meu pai ter deixado a minha mãe quando eu ainda era um bebé de colo e nunca mais querer saber de nós, por me ter arranjado uma madrasta e uma meia-irmã e por lhe dar a sensação de família feliz que nunca tive, posso estar com medo de ele voltar para a mãe do filho primogénito ou nunca ser totalmente dedicado ora a um lado ora a outro, mas posso simplesmente estar a ver as coisas do seu lado prático ou falta dele. Ter duas famílias, neste caso concreto não me parece uma boa gestão, ter um filho cujo acompanhamento parental não será efectivo por não poder estar presente todos os dias, semanas ou meses porque geograficamente se traduz em algo economicamente inviável irá trazer infelicidade a mais para um dos lados e vai levar a conflitos. Não estou a ser demasiado cobarde ou racional, estou apenas a ser cautelosa, tenho de o ser pois neste caso, neste momento que é o presente, não existe nada que alimente um futuro, existe apenas a recordação do passado. Pouca comunicação existe, não há presença, não há continuidade, não há nada. Há um vazio. E no fundo eu sei que não quero ser a madrasta de ninguém. Ao mesmo tempo que digo para mim mesma: tenho que enfrentar isto cara-a-cara, outra parte de mim diz-me que existem já demasiados factores que impedem a aproximação. Para ele nada é impeditivo, talvez até esteja correcto e talvez eu já não sinta a mesma força incontrolável que nos uniu na altura, se sentisse também iria dizer que nada é impeditivo.
Quanto ao futuro, não há futuro, geograficamente não se chegou a quebrar a barreira porque decidi que não vale a pena, se estou enganada nunca poderei saber, resta-me portanto aceitar que me decidi não sofrer mais por isto, passou e vá em paz que de paz também eu preciso.
O fantasma ganhou talvez outra forma, ao contrário de uma forma material uma forma gasosa, esfumando-se, evaporando-se e desaparecendo no ar, pelo menos assim o quero crer, quero acreditar que isto desapareceu de vez, o homem perfeito que era o fantasma a quem neguei tantas vezes a tentativa de reconciliação deixou de ser perfeito, vai ser pai, mal ou bem está a seguir com a sua vida para a frente e eu tenho de fazer o mesmo com a minha. Não fui e não vou atrás daquilo que julgava ser o correcto e desta vez, é o meu instinto automático que mo diz para não fazer.